A doce e prestativa 
Sophia Bennett é autora de 
Linhas, lançado pela 
Intrínseca no  ano passado. Seu livro, um conto de fadas moderno e com um pano de  fundo social, vem fazendo sucesso no exterior e agora no Brasil, e  contou até com dois eventos super especiais de lançamento.
Apaixonada  por moda, ela concedeu uma entrevista exclusiva ao Literalmente  Falando, contando sobre suas paixões, o que a inspira e até falou um  pouco sobre projetos futuros.
• "Linhas" é uma explosão de cores e tecidos. Costura faz parte do seu dia-a-dia ou você teve que pesquisar sobre isso?
Eu acho que venho  pesquisando durante toda minha vida. Eu me interesso por costura,  tecidos, fantasias e até mesmo uniformes desde que era muito pequena.  Minha mãe fazia minhas roupas quando era criança. Minhas avós tricotavam  e faziam camisas femininas. Eu não sou boa costurando vestidos,  infelizmente (embora eu seja ótima em bordado!), mas eu amo pessos que  podem criar coisas. Eu acho todo tipo de criatividade fascinante.
Quando  eu tinha 20, comprei um top da Kenzo. Essa foi minha primeira peça de  marca. Eu só tenho duas ou três. Normalmente eu vivo de jeans e  cardigan. (Na verdade, pensando sobre isso, meu cardigan favorito é da  Nicole Farhi, uma designer britânica muito boa, mas isso não é comum  para mim!).
Eu sempre soube que  queria ser uma escritora, mas isso não impediu que eu continuasse me  interessando sobre moda e fantasias. Eu guardava histórias que ouvia a  respeito de grandes designers, e minha casa é lotada de revistas antigas  contendo meus looks preferidos do tapete vermelho. Eu sempre assisti ao  Oscar por causa desses momentos enormes de moda, e segui as  celebridades enquanto elas cometiam erros de moda ou vestiam o vestido  perfeito pra ocasião perfeita.
Então,  quando eu comecei a escrever Linhas, eu não precisei fazer muita  pesquisa extra sobre moda, mesmo que não faça parte do mundo da moda no  meu dia-a-dia. Eu acho que tem milhões de nós lá fora que são  especialistas em moda por natureza. Eu fui a um desfile, realizado num  restaurante próximo a minha casa, porque eu nunca havia visto um grande  desfile - embora tenha visto um. Eu pesquisei poucas coisas na Internet.  Eu fiz a cena da ST Martins baseada na formatura de arte que meu primo  fez em outra faculdade em Londres. Eu tie que usar muita imaginação é um  pouco de trapaça.
As roupas de  Nonia são o tipo de coisa que eu queria ter a coragem de usar quando  tinha sua idade. Eu vesti um pouco de coisas "anormais", mas não o  suficiente. Eu acho que ela será bem estilosa quando for mais velha,  porque ela vai ter experimentado quase tudo e vai saber o que funciona  nele. Tentar imaginar essas roupas enquanto estava escrevendo o livro  não foi nada fácil!
• Crow é uma personagem muito  especial e diferente, com muito talento e uma história difícil por  trás. Mas ainda assim, ela brilha. Você se inspirou em alguém pra  cria-la ou foi apenas produto da sua imaginação?
Crow apenas surgiu na minha  mente, quase formada completamente como uma personagem. Ela não é  inspirada em ninguém em particular, mas ela é minha ideia sobre como um  gênio deve parecer. Quando você ouve histórias sobre grandes  compositores, ou matemáticos, ou atletas, eles sempre parecem muito  focados, trabalhando duro - mesmo na infância - e um pouco teimosos.  Crow sempre foi desse jeito para mim. A ideia sobre o pano de fundo veio  depois, mas combinava perfeitamente com ela. Eu nunca a imaginei como  uma pessoa triste. Ela é inspirada por cores e formas e coisas belas.  Ela era inspirada na Uganda e continua sendo em Londres. A imaginação  dela é brilhante e bonita e isso a faz contente.
Muitas pessoas criativas que eu conheço são disléxicas e tem problemas  em ler e escrever. Eu imaginei que no caso de Crow isso pudesse ajudar a  desenhar - porque por não se interessar por livros (diferente de mim -  eu sou apaixonada por eles!), ela teria mais tempo pra praticar seus  desenhos. Ela não deixa isso trava-la, e eu amo isso nela.
O sorriso é minha coisa favorita nela. É apenas dela. Eu não copiei isso de lugar algum, até onde sei.
• Se você pudesse escolher uma de suas personagens para ser sua melhor amiga, quem seria?
Que pergunta interessante! E  difícil. Eu estou tentada a responder Nonie, porque ela é muito leal, um  pouco doida e você nunca sabe exatamente o que esperar dela. Eu acho  que seria Edie, apesar disso, porque ela é um pouco como eu, mas ela  trabalha muito salvando o mundo e eu acho que aprenderia muito com ela, e  teria muito orgulho dela. Seria fascinante ser amiga de Jenny, mas  seria um trabalho duro, eu acho. E claro, Crow seria muito silenciosa.
• Quando você começou a escrever seu livro, imaginou que seria lançado em outros países, como aqui no Brasil?
Nunca! De verdade, nunca mesmo! É  TÃO legal. Enquanto eu escrevia o livro, eu fiquei bem ligada aos  personagens e a história e então eu pensei - não seria legal se fosse um  filme? Eu imaginei o filme, e a linha fashion que talvez nós  lançássemos em lojas e até mesmo estojos de Linhas. Mas eu nunca  imaginei ser traduzida. O quão louco é isso? E eu não fazia ideia que as  pessoas no Brasil fossem tão apaixonada por livros (até que descobri  lendo o maravilhoso blog da Meg Cabot). Desde que soube, eu quis muito,  muito, muito que o livro fosse publicado aí, porque eu achei que os  brasileiros fossem gostar da moda e da história incomum. Eu estou tão  feliz que o lançamento correu bem, e todo mundo foi tão legal sobre  isso. Isso me traz um sorriso no rosto diariamente.
• Em sua opinião, qual é a  diferença entre seu livro e outros livros adolescentes que falam sobre  moda? (Pergunta enviada por Maysa Gois)
Bom, para começar, eu não acho  que tenha livros adolescentes o suficiente sobre moda. Eu não posso ser a  única pessoa que era fascinada por moda quando eu tinha doze ou  quatorze anos, certo? Eu gostaria que tivesse mais. Mas os que eu li  geralmente eram superficiais. Eles falavam sobre coisas que as pessoas  vestiam todos os dias, mas não sobre a indústria da moda, ou sobre como  as mais belas roupas e costuras são feitas, ou o que inspira os  estilistas e eu queria explorar tudo isso em um jeito mais sério - mesmo  que o estilo fosse cômico. Eu levava moda muito a sério quando estava  crescendo. Eu gosto de detalhes - então foi isso que tentei colocar como  escritora.
E também, é claro, o  livro fala sobre crianças soldados também. Quando eu coloquei isso  dentro da história, eu pensei que estava sendo ruim, mas não podia  evitar isso - eu realmente queria fazer as pessoas saberem o que  acontecem nos campos (assim como Edie), e eu descobri que eu era tão  apaixonada por isso quando sou pelo lado fashion.
Eu não achava que alguém ia concordar comigo que moda e guerra podem ser  uma boa combinação para uma história, mas eu estava errada. Desde o  primeiro momento que eu exibi o manuscrito, todos entenderam e gostaram  dele! Eu realmente subestimei meus leitores. Eu acho que os assuntos  sérios que Crow teve de lidar despertu o melhor em outras meninas, e  também o melhor na indústria da moda. Pode ser fofo e superficial, mas  algumas vezes isso pode crescer em cima de si mesmo e ser  verdadeiramente inspirador, e fazer algo bom. É uma surpresa pra mim  terminar escrevendo sobre esse lado, mas eu estou feliz que escrevi.
• Mesmo com moda como foco, a  história de Crow tem um plano de fundo social. De onde veio a ideia de  mostrar a vida das crianças da Uganda?
A ideia veio de um poster que eu  vi no cenário alternativo de Londres um dia. Falava sobre os Night  Walkers - as crianças que geralmente tem de andar para a segurança todos  os dias, como Crow fazia. No momento que eu vi isso, aquele poster me  assombrou. Eu estava com tanta raiva que ninguém ajudava aquelas  crianças que estavam sofrendo por causa da guerra. E eu também fiquei  fascinada pelas crianças soldados. O que eles fazem quando crescem? Há  alguma esperança para eles? Henry foi meu jeito de dizer que sim, sempre  tem uma esperança. Muita esperança. Mas você tem de fazer alguma coisa,  como Edie fez. Você não pode sentar e esperar acontecer.
Na verdade, a guerra civil na Uganda acabou e a vida deles é muito  melhor agora, mas ainda há crianças em campos. E é claro, há sempre  guerras em algum lugar, e crianças que são vítimas. Deve haver milhares  de crianças vivendo em campos desconhecidos. Não é uma vida boa e nós  devemos ajuda-las a ter uma vida melhor. Eu espero que as crianças que  perderam suas casas em deslocamentos de terra no Brasil estejam sendo  bem cuidadas, por exemplo. Deve estar sendo um tempo muito difícil para  elas.
• Todo personagem tem algo em comum com seu criador. O que você tem de parecido com Nonie, Edie  e Jenny?
Hmm. Deixa eu pensar...
Você está completamente certa, é claro. Eu coloquei um pouco de mim  dentro de todos os personagens. Nonie tem meu fascínio por moda,  combinado com a fé que eu não posso ser uma estilista porque eu não sei  desenhar. Ela também tem meu otimismo, mas ela é mais otimista que eu.  Foi legal escrever como ela porque ela sempre tende a olhar o lado bom  das pessoas e das situações.
Edie  tem minha habilidade de dizer as coisas erradas e deixar as pessoas  embaraçadas, mesmo quando eu estou tentando fazer o contrário. Além  disso, eu dei muito duro na escola, do jeito que ela faz, e tentei fazer  o máximo de atividades extras. Ela é a provavelmente que mais se parece  comigo. Mas eu não tenho meu próprio website, como ela.
Jenny tem meu tipo físico. Eu era gordinha e envergonhada por isso  quando tinha a idade dela. Eu não sabia o que vestir e infelizmente não  tinha uma amiga como Crow para me fazer peças estilosas. Agora eu  descobri Vivienne Westwood, e vou sempre provar e guardar um de seus  vestidos para ocasiões especiais. Eles são feitos para mulheres  cheinhas! Uhul!
• A literatura voltada para  adolescentes e jovens é cheia de dramas e histórias sobrenaturais, e  Linhas vem contra isso.  Quando você veio com essa ideia, você recebeu  muitos "não's"? Porque escolheu esse tema? (Pergunta enviada pela  leitora Clarisse Cunha)
Obrigada Clarisse! Eu estava  esperando diversos "não's". É claro. Mas o que realmente aconteceu foi  que eu inscrevi meu manuscrito em um concurso nacional para autores  infantis não-publicados. Tinha mais ou menos 2000 inscrições, e eu  ganhei! O prêmio era ser publicado por Barry Cunningham, o homem que  descobriu JK Rowling. Ele e outros jurados da competição me disseram  como eles amaram a história e como eles não queriam muda-la. Então, na  verdade, foi muito fácil ser publicada no fim das contas. (Eu tentei por  dez anos de antemão, com histórias diferentes para adultos, então, não  aconteceu da noite para o dia, mas foi muito excitante quando  aconteceu).
Barry confiava muito  no livro e fez uma excelente divulgação dele no Reino Unido. Teve uma  competição para desenhar um vestido e a vencedora veria seu vestido  costurado e iria a um desfile de verdade em Londres (comigo!). Você pode  vê-lo na capa britânica de "Sequins, Stars & Spolights"*, porque  eu o amei demais! Barry conseguiu o estilista Giles Deacon para fazer  uma linda ilustração para o livro original em capa dura. Você pode  encontrar isso na internet. É maravilhoso! Então, o livro teve um  excelente começo - similar ao que aconteceu no Brasil.
E eu sei que o tema não era comum, mas eu simplesmente TIVE que escrever  minha história. Eu venho contando para mim mesma e para meus filhos por  tantos anos antes de escrever isso. Eu ficava esperando uma outra  pessoa escrever um livro parecido sobre moda para pré-adolescentes, mas  ninguém mais fez. É claro, parece um pouco solitário - tudo rosa e  alegre ao lado dos livros pretos sobre vampiros, fadas e anjos caídos -  mas eu amo os livros de comédia e acho que deveriam ter mais deles. Eu  amo Meg Cabot, por exemplo, e Louise Rennison aqui no Reino Unido.  Algumas vezes, nós só precisamos sorrir e ficarmos alegres com alguma  coisa. Eu espero que meus livros possam fazer isso.
* Ainda não publicado no Brasil, mas as capas nacionais seguem o padrão das capas britânicas.
• Você trabalhou com moda? Se  sim, o quanto isso influenciou seu trabalho e o quanto você precisou  aprender? (Pergunta enviada pela leitora Clarisse Cunha)
Eu nunca trabalhei com moda (a  não ser que conte o mês que eu trabalhei embalando brincos em um armazém  no Leste de Londres). Eu me candidatei para trabalhar na Channel quando  tinha 18 anos, mas eles me ignoraram (não é nenhuma surpresa). Eu  também me inscrevi em uma competição de talentos da Vogue algumas vezes  na minha adolescência, e eu AMARIA escrever para a Vogue. Eu ainda  gostaria, um dia... Mas foi sem sucesso. Então eu fui lobista*,  consultora de negócios e muitas outras coisas enquanto esperava estar  pronta para ser uma escritora. Minha inspiração para os livros não veio  dos meus empregos, mas daquilo que era fascinada quando criança e  continua me fascinando hoje. Na verdade, eu fui a um desfile outro dia e  foi inspirador! Eu provavelmente vou usar algumas ideias que tive lá  para o livro que estou escrevendo agora, que é sobre uma menina que quer  ser modelo.
*Curiosamente,  no Brasil, a atividade de lobista não é regulamentada e pode dar margem  a corrupção (essa sou eu, prestando atenção nas aulas de Comunicação  Empresarial). Saiba mais. 
• Nos agradecimentos, você  agradece aos blogueiros. Nesse mundo, onde todo mundo está conectado 24  horas por dia, 7 dias por semana, o quão grande é a influência dos  blogueiros de moda e literários em seu trabalho?
Blogs  sobre livros me fazem continuar quando estou escrevendo. É sempre muito  difícil conseguir fazer uma cena corretamente, ou um personagem. Eu fiz  tantos amigos pelos blogs, que são ótimos compartilhando a dor e me  deixando para cima, como eu tento fazer com eles. Nós não pedimos  exatamente conselhos uns aos outros - só é bom saber que não estamos  sós. E resenhas em blogs de livros são um excelente jeito de descobrir o  que as pessoas pensaram sobre o livro quando ele é publicado. É por  isso que tenho gostado tanto dos blogs brasileiros!
Espero que tenham gostado da entrevista e curtam o livro da Sophia, que é  uma delícia de ler. E a Sophia, só queria agradecer pelo cuidado e por  ter sido tão prestativa em responder minhas perguntas!